Capítulo 3 - 2001 - Peru


É, realmente o mundo não acabou em 2000 e em 2001 eu arrumei as malas novamente e dessa vez o rumo foi América do Sul. Fui conhecer as ruínas da mística Machu Picchu.

Uma amiga que voava de parapente comigo, a Carla, quando soube que eu iria fazer esta viagem, decidiu ir comigo. Do pouco tempo que restava para a viagem, ela resolveu tentar se preparar um pouco para enfrentar a caminhada da Trilha Inca. Afinal, meu objetivo era ir até lá. Desta vez, eu estava realmente de férias e estava fazendo, pela primeira vez, uma viagem totalmente minha. É pena que eu não pude colocar
neste livro todas as fotos que eu tirei (lembra que nesta época eu não tinha máquina digital!).

Mochila, vacina contra febre amarela, passagens. Agradeço à minha amiga Tathy pela mochila porque eu só tinha mala de rodinhas. Tudo pronto para a viagem, quando no dia anterior, eu em casa já de férias e assistindo a televisão, vejo a seguinte notícia: atacaram o World Trade Center. É isso mesmo, era dia 11 de
setembro de 2001, véspera da minha viagem quando essa tragédia aconteceu. Vários amigos me ligaram perguntando se eu ainda assim iria viajar. Existia um rumor sobre a 3ª Guerra Mundial.

Claro que eu fiquei apreensiva sobre o que aconteceria no mundo no dia seguinte. Afinal, eu embarcaria no dia 12 de setembro de 2001. E embarquei. Os aeroportos estavam todos com atenção redobrada. Tivemos a mochila revistada por várias vezes seguidas. Mas no final foi tudo bem.


Ainda no aeroporto Tom Jobim (o Galeão) tive o primeiro susto. Eu havia esquecido em casa o cartão de vacina da febre amarela. Eu o tinha tirado de dentro do passaporte para tirar uma cópia e esqueci de colocá-lo lá novamente. Consegui fazer o check in, porém a cia aérea me alertou de que sem o cartão eu não voltaria ao Brasil. Acertei tudo com meus pais e eles, no dia seguinte, o enviaram para o correio central de Cuzco, já que ainda não sabia em que hotel eu ficaria.

E chegamos a Lima. Não ficaríamos na capital no início da viagem, mas sim no final, quando teríamos que estar lá para retornarmos ao Brasil.

No aeroporto, em Lima, fomos buscar a passagem mais econômica para chegarmos a Cuzco. Nós saímos do Brasil somente com a passagem de ida e de volta. Nem hotel nós tínhamos. Iríamos decidir tudo na hora. E foi tudo perfeito. Compramos a passagem e fomos para Cuzco.

Já na chegada no aeroporto, uma recepção típica peruana. Um grupo tocava e cantava músicas típicas. Lá mesmo, no desembarque havia uma série de stands ou “lojinhas” oferecendo pacotes e hotéis. Depois de pesquisarmos todas, escolhemos um hotel simples, econômico, mas bem aconchegante. Já na chegada no hotel, nos ofereceram o famoso Mate de Coca. Segundo os locais, a folha de coca alivia os efeitos da altitude. Cuzco fica a 3.395m acima do nível do mar, então eles tomam chá de coca ou mascam a própria folha da planta. Eu, particularmente, não achei o chá muito gostoso e como naquela época eu treinava capoeira praticamente 2 horas por dia, eu estava em muito boa forma física e quase não senti os efeitos da
altitude. Somente no primeiro dia foi que eu senti um pouco de dor de cabeça e muito sono.

Deixamos as mochilas no hotel e fomos conhecer a cidade. O primeiro evento com o qual nos deparamos foi uma passeata, onde protestavam algo contra o Ministério da Saúde. Continuamos passeando pela cidade. Fomos ao mercado local, comprar roupas e coisinhas típicas. Por causa do efeito da altitude, eu sentava em qualquer banquinho e praticamente cochilava. Era até engraçado. À noite fomos para a badalada
Plaza de Armas, onde há os melhores bares, boates e restaurantes da cidade. Fazia um friozinho bom, um pouco menos de 10ºC.

No dia seguinte, 14 de setembro de 2001, visitamos o Templo de Qoricancha, que foi dedicado ao Deus Sol, com vista para a cordilheira de Uanakauri. Quando fomos em direção à Plaza de Armas encontramos um grupo de crianças vestidas lindamente com roupas típicas coloridas comemorando o aniversário
do Índio Pachacutec, fundador de Cuzco. Pachacutec significa “o que muda a terra”, o “reformador da terra”.


Ficamos o dia todo passeando pela cidade e comprando souveniers. A hora do almoço era um dilema. A comida mais típica da região é o frango. Onde íamos havia algum restaurante especializado em frango. Outro prato típico, porém em menor escala é a carne de porco. Qualquer outro prato já fica va caro. Como eu não como carne de porco, comi frango durante todo o tempo que estive em Cuzco. Quando voltei para
o Brasil fiquei sem comer frango por um bom tempo. Mas até que achamos um restaurante em um hotel próximo de onde estávamos (nosso hotel não servia refeição) com um preço inacreditável. Pagávamos PEN3, 00 (isso mesmo, aproximadamente um dólar na época) por um kit de entrada, prato principal,
sobremesa e um refresco. E era bem gostosinho!

Todos os dias, depois do almoço, desde que chegamos, nós íamos ao correio central para ver se o documento comprovando que eu tinha tomado a vacina contra a febre amarela já tinha chegado. E nada ainda.

O dia seguinte foi o dia mais esperado da viagem, pelo menos para mim. Chegou o dia que faríamos a Trilha Inca. A ida para Machu Picchu se dá por trem que vai até Águas Calientes e de lá pega-se um ônibus para Machu Picchu. Porém, todos os mochileiros, aqueles que fazem a trilha, pegam esse mesmo trem e descem logo nas primeiras estações para seguir pela Trilha Inca. Há, na verdade, duas escolhas para a trilha: a longa de 4 dias e a curta de dois dias. A Carla estava com medo de não aguentar porque ela sentiu bastante o efeito da altitude e pediu para que fizéssemos a curta, de 2 dias. Acabei concordando, mas eu queria mesmo era fazer a de 4 dias. O trem parte às 06h30 da manhã. E lá estávamos eu e Carla prontas para a caminhada. O trem partiu e a primeira subida é bem interessante. Eu levei um tempo até entender o que estava acontecendo. O trem sobre “zigezagueando” a montanha. Sobe um trecho de frente e o outro de ré. E assim vai até o final, onde ele segue margeando o Rio Urubamba. Esse rio é considerado o Rio Sagrado dos Incas e segue até Machu Picchu.

O visual até chegar a nossa estação é muito lindo e a cada parada há muitos peruanos vendendo artesanato local e “choclo”, uma espécie de espiga de milho.


Chegamos ao km 104, onde descemos e cruzamos o Rio Urubamba, a 2.150m de altitude, para iniciarmos a trilha. Dali, o trem segue com o restante dos viajantes até Águas Calientes.



Iniciamos a mística trilha que vai até Machu Picchu. Nos juntamos a um grupo de mochileiros de várias nacionalidades diferentes e as únicas brasileiras éramos eu e a Carla. Ao todo éramos 10 pessoas. Não era permitido fazer a trilha sem o acompanhamento de um guia. Há diversos pontos de verificação durante
a trilha para garantir a preservação porque ao longo dos anos o homem vem deixando muito lixo e depredando o lugar.

Tivemos a nossa primeira parada para o almoço. Pode imaginar como foi? Um pedaço de frango com pão, refrigerante e depois uma maçã. Para minha sobrevivência, eu tive a sorte de resolver levar muitas barrinhas de cereal. A cada 2 horas eu comia uma barrinha. Foi o que me sustentou durante a trilha.

A trilha é de certa forma bem tranquila. A subida em alguns momentos é bem puxada, principalmente pelo ar rarefeito. O caminho é todo de pedra e a vegetação bem aberta. Em um certo momento, a Carla estava bem cansada e chegou a pensar que não iria conseguir terminar. Foi, então, que eu resolvi levar não só a minha mochila, mas a dela também. Acho que nunca mais eu vou estar em forma como naquela época!


Durante todo o percurso passamos por ruínas e algumas cachoeiras além do visual do Rio Urubamba lá embaixo.




A maior ruína durante a trilha, a partir do km 104, é Wiñay Wayna, um conjunto de casas interligadas. Wiñay Wayna significa “Sempre Jovem” e fica a 500m acima do Rio Urubamba.



Seguimos a caminhada e já começava a escurecer quando chegamos no acampamento, onde passamos a noite em uma barraca. Ah, finalmente um banheiro. Durante a trilha não há banheiros!

No dia seguinte, ainda madrugada, os guias nos acordaram para continuar a caminhada. Arrumamos tudo e partimos. Foi este o momento mais emocionante de toda a viagem e acho que um dos mais místicos de todas as viagens que já fiz na vida. Caminhando na trilha, ainda escuro, eu tinha a sensação, mas era uma sensação muito forte de que um índio Inca andava ao meu lado. Eu via uma cidade Inca em movimento.
Era uma energia que eu não consigo explicar. Continuamos andando até chegar no ponto culminante da trilha: Inti Punku, a Porta do Sol. É neste ponto onde vemos Machu Picchu pela primeira vez.


Machu Picchu significa “Pico Velho” ou “Montanha Velha”. É magnífica a vista deste lugar que impõe respeito. Na Porta do Sol inicia-se a descida até as ruínas. A cidade de Machu Picchu fica aos pés da montanha Huayna Picchu que significa “Pico Jovem”.

Caminhar pelas ruínas é incrível. A cidade é muito bem planejada e a agricultura era a principal atividade. A colheita era levada para o alto de Huayna Picchu, pois em função da baixa temperatura havia uma conservação dos alimentos por mais tempo.


Após caminhar por toda a cidade eu descobri que era possível ir até o topo de Huayna Picchu através de uma trilha, um pouco mais puxada do que a Trilha Inca, mas em uma hora e meia eu subi e desci. É uma visão diferente do tradicional cartão-postal de Machu Picchu. Valeu a pena a subida. Esta trilha, a Carla
decidiu não fazer porque já se sentia cansada e quando eu estava descendo, para minha surpresa, encontrei com ela subindo já no meio do caminho. Lógico que eu voltei e subi tudo outra vez.

Quando descemos, fomos direto para o ponto de encontro onde juntaríamos com o grupo novamente e partiríamos para Águas Calientes. Foi de lá que pegamos o trem de volta a Cuzco.

Depois de dois dias de caminhada sem ver um chuveiro, chegamos no hotel e o banho foi bem demorado. Finalmente, uma roupa limpinha, cheirosa e uma cama macia.

No dia seguinte, fomos direto ao correio central e, para minha felicidade, o cartão da vacina tinha chegado. Eu já podia voltar ao Brasil sem preocupação.

Continuamos nosso passeio por Cuzco. Alugamos uns cavalos perto das ruínas de Sacsayuaman e fomos fazer o percurso que os Incas faziam para fugir dos espanhóis. Sacsayuaman foi o lugar onde aconteceram as maiores batalhas entre os Incas e os espanhóis. Os nativos entravam em labirintos dentro da montanha Apusarseywaman, que significa “Espírito da montanha”, completamente escuros e estreitos e saíam do outro lado. Claro que estávamos com um guia local, o Edgard. Ele nos levou, também, ao Templo de La Luna, onde havia cerimônias religiosas. Quando era noite de lua cheia, a luz da lua iluminava diretamente o centro do altar. No altar se sacrificavam lhamas para serem oferecidos aos deuses. Ali, também eram oferecidas aos “Deuses Apus” três mulheres virgens, filhas ou irmãs dos Incas que eram escolhidas para serem suas esposas. Após o sacrifício, o corpo das três mulheres era colocado no Sarcófago das Múmias.


Voltamos para o hotel já à noite para uma ducha e fomos jantar. Antes, passamos em frente ao Templo Qoricancha. Era a primeira vez que passávamos por ali àquela hora. Era uma beleza diferente. Fazia muito frio naquela noite. As luzes do templo davam um ar especial ao lugar.

No dia 18 de setembro de 2001 estávamos de volta a Lima e a primeira coisa que eu vi quando chegamos foi a Pizza Hut. Depois de dias comendo “pollo” (frango em espanhol) nunca fiquei tão feliz em ver uma pizza. Ficamos hospedadas em Miraflores um bairro nobre de Lima. Visitamos a cidade e eu não podia deixar de conhecer o local onde se voa de parapente. Estivemos na rampa de decolagem onde a paisagem
é bem bonita.









Tínhamos alugado um carro e fomos conhecer as praias do sul. Não tínhamos muito tempo pois era o nosso penúltimo dia no Perú. As praias eram bonitas, mas estavam bem vazias. Estou acostumada com o Rio de Janeiro que até chovendo tem gente na praia e ver praias assim vazias foi um pouco estranho.

Fomos seguindo o litoral até onde o tempo nos permitiu.



Na volta para o hotel nos perdemos várias vezes. Apesar de as placas indicarem o caminho de Lima, demos muitas voltas e finalmente encontramos um guarda de trânsito no meio da confusão. Diga-se de passagem era bem confuso dirigir em Lima. Fizemos algumas perguntas ao guarda, mas nem ele sabia direito qual direção tínhamos que tomar. No final, tudo acabou bem. Finalmente chegamos no hotel. Devolvemos o
carro e decidimos andar a pé.

No dia seguinte, andamos muito e sempre a pé. Andamos pelas praias de Miraflores, pelo centro comercial e fomos comprar as lembranças para a volta. O final da viagem se aproximava.

Saímos à noite para comer algo quando nos deparamos, em plena cidade de Lima, com um bar bem brasileiro, chamado Alô Brasil. Claro que paramos aí mesmo. E essa foi nossa última noite em Lima. Olha eu e minha amiga Carla fechando a viagem em clima brasileiro.




No dia 20 de setembro de 2001, arrumamos as mochilas e partimos de volta ao Brasil. Alguns meses depois já planejava a viagem das próximas férias em 2002.



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